Rosto de mulher condenada por bruxaria durante a inquisição é reconstruído

Reconstrução do rosto de Lilias Adie

Lilias Adie, acusada de bruxaria em 1704, na Inquisição, teve seu rosto reconstruído em 3D.

As perseguições e julgamento de mulheres acusadas de bruxaria, no início do século XVIII, foram se tornando cada vez mais raras na Europa continental e nas ilhas Britânicas. 

O ápice da infame caça às bruxas ocorreu em meio às crescentes tensões entre católicos e protestantes, entre os anos de 1560 e 1660,que culminaram nas sangrentas guerras santas. 

Vejamos um exemplo, em 1692 a cidade de Salém, localizada na baía de Massachusetts, fora palco do mais famoso e injusto  julgamento de mulheres (e de poucos homens também) acusadas de pacto com o diabo e de feitiçaria. 


Muitas pessoas inocentes foram brutalmente torturadas e assassinadas, devido o fanatismo religioso e o péssimo processo de condução do julgamento, contribuindo assim para desacreditar esse tipo de julgamento junto às autoridades judiciais e religiosas. 


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Não obstante, com a promulgação dos ideais iluministas, começou-se a combater fortemente o misticismo e a crença no que chamam de "paranormal". Porém, entre a classe camponesa, o imaginário acerca magia, bruxas, feitiços e elfos, e outras entidades, sobreviveu ainda por algumas décadas.

Aqui entra Lilias Adie, de Torryburn (Escócia), que foi condenada por prática de bruxaria em 1704, depois que ela aparentemente “confessou” (as torturas eram tão cruéis que os réus confessariam qualquer coisas) suas relações com o diabo.


Fotografia da face reconstruída de Lilias Adie

Rosto de mulher condenada por bruxaria durante a inquisição é reconstruído

O período que dura do século XV ao XVIII, evoca figuras surpreendentes, se tratando de caça às bruxas. Segundo estudos, cerca de 40.000 ou 60.000 pessoas foram executadas cruelmente, apenas por serem consideradas bruxas, nas colônias americanas e na Europa.

Cerca de 10.000 a 15.000 dessas vítimas foram homens - ao contrário do que muitos dizem sobre apenas mulheres tendo sido assassinadas, de qualquer maneira, elas foram a maioria.

Lilias Adie, a mulher que teve o rosto reconstruído recentemente, foi condenada à morte mais comum e infame da inquisição - queimada viva - mas acabou morrendo na prisão, tendo a causa da morte registrada como "desconhecida".

Os boatos diziam que ela havia se suicidado (como na maioria dos casos), e foram amplamente difundidos na época, algo que, passados três séculos ainda não mudou foi isso, o fato das pessoas acreditarem em tudo o que ouvem.

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Pesquisadores da Universidade de Dundee, em 2017, reconstruíram o rosto de Lilias Adie, para o programa de viagens no tempo da BBC Radio Scotland. 

Tais pesquisadores, associados ao CAHID (Centro de Anatomia e Identificação Humana), acreditam que a reconstrução do rosto de Lilias Adie seja, possivelmente, a única evidência exata de como uma mulher condenada durante a inquisição, na Escócia, se pareceria.

Como boa parte das vítimas foram queimadas vivas, dificultou-se a possibilidade de recriar o rosto de alguma dessas pessoas.

De acordo com o historiador Jeffrey B. Russel, a bruxaria nas ilhas Britânicas diferiu muito da Europa continental, onde a Igreja Católica associava tal prática ao culto ao "diabo".

Na inglaterra e Escócia, onde o protestantismo estava em vigor, não havia Inquisição, apenas uma leve tradição de heresia. Para Jeffrey Russelk, a bruxaria em tais países se aproximava mais da feitiçaria - termos com significados totalmente diferentes - com enfoque na suposta capacidade das feiticeiras rogar pragas e lançar feitiços nas pessoas.

Quando o julgamento de Lilias Adie aconteceu, segundo Russel:


 "a bruxaria já estava fora de moda entre os intelectuais, era raramente levada a sério pelas autoridades governamentais e tinha começado a desvanecer-se na crença popular".


Os julgamentos começaram a cessar nas últimas décadas do século XVII, com algumas raras exceções no início do século seguinte, conforme prova o inquérito de Lilias Adie, ocorrido na Escócia, e o de outra mulher chamada Jane Wenham, que aconteceu na Inglaterra, neste último caso, a mulher foi inocentada.

Através de uma prática incomum, os moradores da região tentaram "aprisionar" os restos mortais de Adie em seu túmulo, provavelmente como um tipo de precaução contra a "bruxa", perturbando o descanso de Lilias. 

A curiosidade científica  em tal caso, foi bem mais inteligente e útil, abrindo um caminho para que o projeto de reconstrução de sua face se concretizasse.

Em meados do século XIX, alguns antiquários resolveram desenterrar os restos de Lilias Adie com fins de estudos e exibição, enviando seu crânio para o Museu da Universidade de St Andrews, onde foi fotografado há mais de um século.

Rosto de mulher condenada por bruxaria durante a inquisição é reconstruído

Especialistas forenses do CAHID tiveram como base as fotos do crânio de Lilias Adie, contrapondo-as a um crânio real, para assim dar-se o processo de reconstrução.


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Não foi uma tarefa fácil, os pesquisadores precisarem investir quase o dobro do tempo que normalmente levaria um processo de reconstrução facil comum (que leva entre 10 e 20 horas), isso por conta do estado de degradação do crânio da mulher.

Além desse processo mais minucioso, a reconstrução também promoveu novidades. O Dr. Cristopher Rynn, a mente que chefiou todo o trabalho na escultura virtual em 3D, afirmou:

"Quando a reconstrução atinge a camada de pele, é como conhecer alguém e eles começam a lembrá-lo de pessoas que você conhece, pois você aprimora a expressão facial e adiciona texturas fotográficas. 

Não havia nada na história de Lilias que me sugerisse que hoje em dia ela seria considerada outra coisa que não uma vítima de circunstâncias horríveis, então não vi razão para colocar o rosto em uma expressão desagradável ou mesquinha e ela acabou sendo bastante gentil."

Rosto de mulher condenada por bruxaria durante a inquisição é reconstruído

A historiadora, Louise Yeoman, do programa Time Travels da BBC Radio Scotland, acrescentou os seguintes dizeres: 

"Eu acho que ela era uma pessoa muito inteligente e inventiva. 

O objetivo do interrogatório e suas crueldades era obter nomes. Lilias disse que não podia dar o nome de outras mulheres nas reuniões das bruxas, pois estavam mascaradas como mulheres gentis. Ela só deu nomes que já eram conhecidos e continuou apresentando boas razões para não identificar outras mulheres para esse tratamento horrendo – apesar do fato de provavelmente significar que não havia mais desânimo para ela. 

É triste pensar que seus vizinhos esperavam algum monstro aterrorizante quando ela era realmente uma pessoa inocente que havia sofrido terrivelmente. A única coisa monstruosa aqui é o erro da justiça."


Com esse procedimento conseguimos ter uma noção melhor de como eram essas "bruxas", acusadas e mortas injustamente. Não vemos chapéus pontudos, narizes enormes ou características estereotipadas, o que vemos é uma senhora que parece, ou melhor, parecia ser bem carismática.


Referências: Relm of History e University of Dundee

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